segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Importantes conceitos para a tradição espartana no Banquete de Platão


Apolo e Urania de Charles Mynier
Benedict Friedlaender


O Banquete de Platão 


Nesse texto de suma importância do Banquete de Platão deve-se notar que eram comuns as relações entre homens na Grécia. Que a recomendação dessa fala era o sexo e o amor entre homens e não com meninos. Alem disso deveria ter um conteúdo de engrandecimento de ambos explicitando assim a sua superioridade como relação sexual e amorosa pela excelência da força e cultivo moral e intelectual de ambos. Ele dar à tônica da relação espartana hoje de que dois homens se unem para gozar e para crescer profissional, intelectual e emocionalmente.
Benedict Friedlaender (Berlim, 8 de Julho de 1866 — Berlim, 21 de Junho de 1908), um dos precursores da tradição espartana, baseado nesse texto criou o termo uranismo ou uranista para se opor ao de homossexual por achá-lo incorreto e preconceituoso.

Assim está escrito no Banquete. O grifo é meu.

Ora pois, o Amor de Afrodite Pandêmia é realmente popular e
faz o que lhe ocorre; é a ele que os homens vulgares amam. E
amam tais pessoas, primeiramente não menos as mulheres que
os jovens, e depois o que neles amam é mais o corpo que a
alma, e ainda dos mais desprovidos de inteligência, tendo em
mira apenas o efetuar o ato, sem se preocupar se é decentemente
ou não; daí resulta então que eles fazem o que lhes
ocorre, tanto o que é bom como o seu contrário. Trata-se com
efeito do amor proveniente da deusa que é mais jovem que a
outra e que em sua geração participa da fêmea e do macho. O
outro porém é o da Urânia, que primeiramente não participa da
fêmea mas só do macho - e é este o amor aos jovens - e depois
é a mais velha, isenta de violência; daí então é que se voltam
ao que é másculo os inspirados deste amor, afeiçoando-se ao
que é de natureza mais forte e que tem mais inteligência. E
ainda, no próprio amor aos jovens poder-se-iam reconhecer os
que estão movidos exclusivamente por esse tipo de amor;não
amam eles, com efeito, os meninos, mas os que já começam a
ter juízo, o que se dá quando lhes vêm chegando as barbas.
Estão dispostos, penso eu, os que começam desse ponto, a
amar para acompanhar toda a vida e viver em comum, e não a
enganar e, depois de tomar o jovem em sua inocência e
ludibriá-lo, partir à procura de outro. Seria preciso haver uma
lei proibindo que se amassem os meninos, a fim de que não se
perdesse na incerteza tanto esforço; pois é na verdade incerto o
destino dos meninos, a que ponto do vicio ou da virtude eles
chegam em seu corpo e sua alma. Ora, se os bons amantes a si
mesmos se impõem voluntariamente esta lei, devia-se também
a estes amantes populares obrigá-los a lei semelhante, assim
como, com as mulheres de condição livre, obrigamo-las na
medida do possível a não manter relações amorosas. São estes,
com efeito, os que justamente criaram o descrédito, a ponto de
alguns ousarem dizer que é vergonhoso o aquiescer aos
amantes; e assim o dizem porque são estes os que eles
consideram, vendo o seu despropósito e desregramento, pois
não é sem dúvida quando feito com moderação e norma que um
ato, seja qual for, incorreria em justa censura.
Aliás, a lei do amor nas demais cidades é fácil de entender, pois
é simples a sua determinação; aqui porém ela é complexa. Em
Élida, com efeito, na Lacedemônia, na Beócia, e onde não se
saiba falar, simplesmente se estabeleceu que é belo aquiescer
aos amantes, e ninguém, jovem ou velho, diria que é feio, a fim
de não terem dificuldades, creio eu, em tentativas de persuadir
os jovens com a palavra, incapazes que são de falar; na Jônia,
porém, e em muitas outras partes é tido como feio, por quantos
habitam sob a influência dos bárbaros. Entre os bárbaros, com
efeito, por causa das tiranias, é uma coisa feia esse amor,
justamente como o da sabedoria e da ginástica; é que, imagino,
não aproveita aos seus governantes que nasçam grandes idéias
entre os governados, nem amizades e associações inabaláveis,
o que justamente, mais do que qualquer outra coisa, costuma o
amor inspirar. Por experiência aprenderam isto os tiranos desta
cidade; pois foi o amor de Aristogitão e a amizade de Harmódio
que, afirmando-se, destruíram-lhes o poder. Assim, onde se
estabeleceu que é feio o aquiescer aos amantes, é por defeito
dos que o estabeleceram que assim fica, graças à ambição dos
governantes e à covardia dos governados; e onde simplesmente
se determinou que é belo, foi em conseqüência da inércia dos
que assim estabeleceram. Aqui porém, muito mais bela que
estas é a norma que se instituiu e, como eu disse, não é fácil de
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entender. A quem, com efeito, tenha considerado que se diz ser
mais belo amar claramente que às ocultas, e sobretudo os mais
nobres e os melhores, embora mais feios que outros; que por
outro lado o encorajamento dado por todos aos amantes é
extraordinário e não como se estivesse a fazer algum ato feio, e
se fez ele uma conquista parece belo o seu ato, se não, parece
feio; e ainda, que em sua tentativa de conquista deu a lei ao
amante a possibilidade de ser louvado na prática de atos
extravagantes, os quais se alguém ousasse cometer em vista de
qualquer outro objetivo e procurando fazer qualquer outra coisa
fora isso, colheria as maiores censuras da filosofia -- pois se,
querendo de uma pessoa ou obter dinheiro ou assumir um
comando ou conseguir qualquer outro poder, consentisse
alguém em fazer justamente o que fazem os amantes para com
os amados, fazendo em seus pedidos súplicas e prosternações,
e em suas juras protestando deitar-se às portas, e dispondo-se
a subserviências a que se não sujeitaria nenhum servo, seria
impedido de agir desse modo, tanto pelos amigos como pelos
inimigos, uns incriminando-o de adulação e indignidade, outros
admoestando-o e envergonhando-se de tais atos — ao amante
porém que faça tudo isso acresce-lhe a graça, e lhe é dado pela
lei que ele o faça sem descrédito, como se estivesse praticando
uma ação belíssima; e o mais estranho é que, como diz o povo,
quando ele jura, só ele tem o perdão dos deuses se perjurar
pois juramento de amor dizem que não é juramento, e assim
tanto os deuses como os homens deram toda liberdade ao
amante, como diz a lei daqui - por esse lado então poder-se-ia
pensar que se considera inteiramente belo nesta cidade não só
o fato de ser amante como também o serem os amados amigos
dos amantes. Quando porém, impondo-lhes um pedagogo, os
pais não permitem aos amados que conversem com os
amantes, e ao pedagogo é prescrita essa ordem, e ainda os
camaradas e amigos injuriam se vêm que tal coisa está
ocorrendo, sem que a esses injuriadores detenham os mais
velhos ou os censurem por estarem falando sem acerto, depois
de por sua vez atentar a tudo isso, poderia alguém julgar ao
contrário que se considera muito feio aqui esse modo de agir. O
que há porém é, a meu ver, o seguinte: não é isso uma coisa
simples, o que justamente se disse desde o começo, que não é
em si e por si nem belo nem feio, mas se decentemente
praticado é belo, se indecentemente, feio. Ora, é
indecentemente quando é a um mau e de modo mau que se
aquiesce, e decentemente quando é a um bom e de um modo
bom. E é mau aquele amante popular, que ama o corpo mais
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que a alma; pois não é ele constante, por amar um objeto que
também não é constante. Com efeito, ao mesmo tempo que
cessa o viço do corpo, que era o que ele amava, “alça ele o seu
vôo”, sem respeito a muitas palavras e promessas feitas. Ao
contrário, o amante do caráter, que é bom, é constante por toda
a vida, porque se fundiu com o que é constante. Ora, são esses
dois tipos de amantes que pretende a nossa lei provar bem e
devidamente, e que a uns se aquiesça e dos outros se fuja. Por
isso é que uns ela exorta a perseguir e outros a evitar,
arbitrando e aferindo qual é porventura o tipo do amante e qual
o do amado. Assim é que, por esse motivo, primeiramente o se
deixar conquistar é tido como feio, a fim de que possa haver
tempo, que bem parece o mais das vezes ser uma excelente
prova; e depois o deixar-se conquistar pelo dinheiro e pelo
prestigio político é tido como feio, quer a um mau trato nos
assustemos sem reagir, quer beneficiados em dinheiro ou em
sucesso político não os desprezemos; nenhuma dessas
vantagens, com efeito, parece firme ou constante, afora o fato
de que delas nem mesmo se pode derivar uma amizade nobre.
Um só caminho então resta à nossa norma, se deve o bemamado
decentemente aquiescer ao amante. É com efeito norma
entre nós que, assim como para os amantes, quando um deles
se presta a qualquer servidão ao amado, não é isso adulação
nem um ato censurável, do mesmo modo também só outra
única servidão voluntária resta, não sujeita a censura: a que se
aceita pela virtude. Na verdade, estabeleceu-se entre nós que,
se alguém quer servir a um outro por julgar que por ele se
tornará melhor, ou em sabedoria ou em qualquer outra espécie
de virtude, também esta voluntária servidão não é feia nem é
uma adulação. É preciso então congraçar num mesmo objetivo
essas duas normas, a do amor aos jovens e a do amor ao saber
e às demais virtudes, se deve dar-se o caso de ser belo o
aquiescer o amado ao amante. Quando com efeito ao mesmo
porto chegam amante e amado, cada um com a sua norma, um
servindo ao amado que lhe aquiesce, em tudo que for justo
servir, e o outro ajudando ao que o está tornando sábio e bom,
em tudo que for justo ajudar, o primeiro em condições de
contribuir para a sabedoria e demais virtudes, o segundo em
precisão de adquirir para a sua educação e demais competência,
só então, quando ao mesmo objetivo convergem essas duas
normas, só então é que coincide ser belo o aquiescer o amado
ao amante e em mais nenhuma outra ocasião. Nesse caso,
mesmo o ser enganado não é nada feio; em todos os outros
casos porém é vergonhoso, quer se seja enganado, quer não.
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Se alguém com efeito, depois de aquiescer a um amante, na
suposição de ser este rico e em vista de sua riqueza, fosse a
seguir enganado e não obtivesse vantagens pecuniárias, por se
ter revelado pobre o amante, nem por isso seria menos
vergonhoso; pois parece tal tipo revelar justamente o que tem
de seu, que pelo dinheiro ele serviria em qualquer negócio a
qualquer um, e isso não é belo. Pela mesma razão, também se
alguém, tendo aquiescido a um amante considerado bom, e
para se tornar ele próprio melhor através da amizade do
amante, fosse a seguir enganado, revelada a maldade daquele e
sua carência de virtude, mesmo assim belo seria o engano; pois
também nesse caso parece este ter deixado presente sua
própria tendência: pela virtude e por se tornar melhor, a tudo
ele se disporia em favor de qualquer um, e isso é ao contrário o
mais belo de tudo; assim, em tudo por tudo é belo aquiescer em
vista da virtude. Este é o amor da deusa celeste, ele mesmo
celeste e de muito valor para a cidade e os cidadãos, porque
muito esforço ele obriga a fazer pela virtude tanto ao próprio
amante como ao amado; os outros porém são todos da outra
deusa, da popular. É essa, ó Fedro, concluiu ele, a contribuição
que, como de improviso, eu te apresento sobre o Amor”.